terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Resenha (moderadamente) crítica: As Vantagens de Ser Invisível




Segundo Charlie, o personagem principal, uma obra em si pode até ser “muito interessante”, mas não é “muito boa” a menos que te faça sentir diferente no fim. E foi assim que eu me senti nesta segunda-feira quando terminei a leitura deste livro magnífico. Quando comecei a lê-lo, não gostei muito porque achei o protagonista bobo, meio retardado. Mas aí fui levando em consideração o contexto: um garoto de quinze anos no ano de 1991. Depois pensei em como eu pensava quando eu tinha quinze anos (não muito diferente). Depois fui entendendo as questões propostas pelo autor, e me encantando cada vez mais com a doçura e simplicidade com que ele me cativava a cada página, a cada carta. Sim, pois The Perks of Being a Wallflower é um romance epistolar. Um romance epistolar! Em 2013! E, por Deus, é maravilhoso!

Não é segredo para ninguém que eu sou fascinado por adolescentes, digo, por seu modo de vida e psicologia. Há muito tempo acompanho assiduamente filmes e livros com essa temática. Também não considero interessante (a princípio) histórias que não contenham, no mínimo, um desses três elementos: sexo, drogas, violência. Simplesmente porque a vida é assim. E As Vantagens de Ser Invisível tem todos! E não precisou ser um Skins pra isso. 

Muitas vezes a inocência de Charlie me lembrou de Brian Lackey do drama Mysterious Skin (Mistérios da Carne), de 2004 – inclusive pela minha suspeita latente de que algo muitíssimo importante havia marcado seu passado (e como eu estava certo!). Outras tantas me lembrou Zac Beaulieu, de C.R.A.Z.Y. (Loucos de Amor), de 2005 – tanto por seu aniversário ser no dia 24 de dezembro e da relevância desta data na história com seu contexto ironicamente religioso e um acontecimento em um de seus aniversários, quanto por ele ser o mais novo de uma família (um pouco) numerosa, e ainda mais pelo modo como suas descobertas sexuais são exploradas. Mas Charlie é mais do que a carga genética de Brian e Zac (talvez ele tenha sido pai dos dois, visto que o romance foi escrito em 1999) misturada. Há algo de perturbador, de inquietante e ao mesmo tempo com um efeito de morfina a seu respeito que pega o leitor num laço quase impossível de se soltar.

O filme eu ainda não vi, mas cheguei a ouvir a trilha sonora (enquanto lia!), e fez todo sentido, porque as músicas combinam com os gostos dos personagens. Apesar de viverem na década de 90, eles gostam de músicas de épocas anteriores. Asleep (1987), de The Smiths que o diga! E dá-lhe intertextualidade, pois Chboski dialoga com maestria menções a obras literárias dos séculos XIX e XX (fora Hamlet, lógico) conhecidas por muitos de nós com seu texto: O Grande Gatsby de Fitzgerald, Pé na Estrada de Kerouac e O Apanhador no Campo de Centeio (cujo protagonista se chama Holden Caulfield, este sim seria um bom candidato a pai literário de Charlie) de Salinger. É bom levar em consideração que este último é lido várias vezes por Charlie em uma fase difícil em sua vida, quando ele “não queria pensar”. Os livros são recomendados por seu professor de Língua Inglesa Avançada e têm uma grande razão de ser na história, inclusive a ordem em que aparecem – mais um ponto para o autor!



Com uma linguagem simples, mas muitíssimo bem articulada e com justificativas plausíveis para as escolhas do autor, as cartas de Charlie para um leitor desconhecido (que na verdade você acaba descobrindo que conhece bem até demais) são cativantes e emocionam por nos proporcionar o prazer de ler um bom romance através da revelação de “pensamentos secretos [...] [que são negados] ao historiador, ao biógrafo e até mesmo ao psicanalista”, e nos dando “conhecimento sobre o coração humano, ou sobre a mente humana” (David Lodge). A narrativa é envolvente porque enche o leitor de dúvidas, mas são perguntas complexas que se alojam em um nível mais profundo da mente durante a leitura e vão se acomodando e transformando à medida que se avança pelos parágrafos. O texto também me conquistou causando bastante empatia – a sacada de Charlie dizer que está dando nomes falsos foi de longe genial; ele e os amigos podem ser qualquer um de nós. Muitas vezes eu vi minha vida ser narrada ali e sob uma ótica incrível. Sem contar com os momentos poéticos do texto em que o autor utiliza metáforas, jogos de palavras (muitos presentes inclusive na tradução de Ryta Vinagre, para a Rocco), mesmo um poema completo está incluído – sem título, que eu achei lindíssimo e que merece uma análise exclusiva posterior –, fora os trechos à la Sra. Dalloway de Virgínia Woolf ou Ulysses de James Joyce, em que Charlie praticamente derrama seus pensamentos nas cartas sem sequer se dar o trabalho de organizá-los, num monólogo interior ou fluxo de consciência (que está mais pra fluxo de inconsciência, quem ler entenderá o motivo). Um dos pontos altos da narrativa é quando Charlie tem suas epifanias, que são momentos de revelação quase transcendentais que “brotam” de coisas simples como uma passagem de carro sob um túnel em que ele revela aos amigos sentir-se “infinito”.

A atmosfera é outra coisa encantadora, pois há elementos que me transportaram para aquele passado dos videoteipes, das compilações em fitas cassete e os hábitos e cenários americanos que, mesmo ainda estando praticamente a mesma coisa, causam uma deliciosa sensação de nostalgia. A ausência total de menções à internet ou computadores (muito bem substituídas por uma “nova máquina de escrever antiga”) pode ser chocante para a atual e crescente geração facebook, mas me fez refletir sobre a real necessidade de ferramentas que temos hoje e a carência da verdadeira importância de “participar” da vida efetivamente vivida, cujos males certamente irão marcar o futuro dos meus filhos e até mesmo o meu próprio.

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