sábado, 21 de janeiro de 2017

Faith


Nunca pensei. A vida hoje parece tão diferente. É como se toda a mudança que eu sempre quis tivesse chegado de uma vez e agora eu não soubesse o que fazer com ela. O passado me parece fragmentos de um filme mal produzido e mal roteirizado que só podia contar com um protagonista cheio de paixão. Era ele e não a história o tempo inteiro. É realmente difícil de acreditar que tudo aquilo aconteceu: que eu estive em todos aqueles lugares, que todas aquelas pessoas eram de carne e osso ao invés de pontos piscando atrás das minhas pálpebras. Depois das feridas fechadas e do novo perfume desse cenário familiar, parece que tudo não passou de um delírio que eu tive à porta de casa e que eu nunca cheguei a sair de verdade. Há ainda a sensação de que eu estou traindo aquele eu ao encontrar tanta indiferença diante dos "fatos". Um pouco de culpa por estar feliz, por estar bem melhor assim, Mas isso que é paz. É assim que eu me reencontro com um "eu" de uma época ainda mais distante. É assim que fazemos as pazes.
Lírio dos vales, 16 de março de 2014 



Lírio dos vales foi escrito por mim há três anos. Pelo que me consta, época em que eu larguei a faculdade de Letras na UFPB para viver outras coisas. Curtir mais a minha casa e minha família, especialmente. O que me chama atenção nesse texto é o fato de, naquele momento, eu estar tão satisfeito com a minha decisão, tão seguro, que uma sensação implacável de paz se abateu sobre mim, varrendo os receios para longe ao simplificar tanto o passado que as lembranças ficam num limbo entre memória e devaneio.

Poucas vezes na vida eu me senti tão satisfeito com uma decisão. Aquela busca por satisfação comigo mesmo, que levaria à satisfação com a minha vida, estava apenas começando. A autocompaixão é uma coisa muito dura de se conquistar. Eu exigia muito de mim mesmo; minha própria professora da quarta série já me falou isso! Essa exigência foi muito mais severa na adolescência, levando a minha autoestima pelo ralo. Uma adolescência problemática assim só poderia me tornar num jovem adulto problemático, instável emocionalmente, carente, dependente, insatisfeito consigo, como muitas pessoas que eu conheço nessa idade hoje são.

Mas eu sempre tive fé que um dia eu iria entender algo que estava na minha cara o tempo todo, mas ao mesmo tempo algo tão importante que de duas, uma: Ou minha vida iria se desgraçar de uma vez e eu entraria em um colapso irreversível, ou eu conciliaria todos os meus pensamentos numa corrente fluida e coerente. 

Largar a universidade em 2014, terminar o relacionamento abusivo que vivi em 2015 e enfrentar uma área fora da minha zona de conforto no trabalho em 2016 foram coisas que me mostram que eu realmente tirei alguma coisa de tudo que eu vivi, de todas as coisas que deram errado.

Vez por outra eu estou enfrentando um probleminha que me entristece bastante, isso porque eu, como o resto da Geração Y, sou muito ansioso. Mas aí o que me resta é tentar controlar os impulsos (coisa em que eu estou me saindo muito bem) e ficar de olho em alguns sinais que a vida vai mostrando, que dizem coisas como "não faz isso", "experimenta tal atitude" ou "é por aí mesmo, ta dando certo".

Mesmo que eu faça um draminha, eu acho que estou conseguindo conduzir essa nave da melhor maneira possível e estou bem feliz com tudo isso. Ainda mais agora que escrevi esse texto. :)

P.S.: A flor ilustrando esse texto não é um Lírio dos vales. O motivo da escolha é que o título da fotografia é Faith.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Cada sarda sua - Tradução de 'Every other freckle', de Alt-J

Dê o play aqui

Oooaaahhhh
Eu quero partilhar da sua boca cheia
Quero saber de todas as coisas que os seus pulmões sabem tão bem
Eu quero me aninhar em você um gato se aninha num pufe
Virar você do avesso e te lamber como uma tampa de iogurte

Oh, ooh - Ei!

Você é o primeiro e último da sua espécie (me puxe como se eu fosse um animal num buraco!)
Eu quero ser cada alavanca que você puxa
E todos os banhos que te banham
Quero tatear você como um gato tateia meu casaco de lã
Ser seu Pequeno Polegar
E desfrutar de coisas pequeninas e belas

Ei!
Oh, ooh
Devore-me
Ooohhh

Lou, Lou, que cantem as meninas do cover
Ei!

Du, du du du, du du du duuuuu
Du du du,  du du du,  du du du du, du duuuuu
Du du du,  du du du,  du du du du du,  du du du du duuuu

Todas as mãos aplaudem
Você aplaudirá
Deixe-me ser o papel de parede que reveste o seu quarto!
Eu quero ser cada botão que você aperta
E todos os banhos que te envolvem
É, eu vou rolar em você
Como um gato num pátio de serragem - Ooohhh
Eu vou te beijar
Como o sol que te bronzeia

Ei!
Oh, ooh - Ei!
Devore-me
Oh, ooh - Ei!
Devore-me
Se você acha mesmo que consegue me digerir - Ei-ei!

Eu quero cada sarda sua
Eu quero cada sarda sua, sarda


Videoclipes
Versão Boy: https://www.youtube.com/watch?v=axTSc3e6wu8
Versão Girl: https://www.youtube.com/watch?v=-mhgfXgwdls

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Boa tarde. Desculpa interromper a sua viagem, mas eu gostaria de deixar com você um pouco da palavra do seu cérebro


Muito bem. O ano de 2017 chegou e com ele muitas promessas, expectativas, frustrações, (necessariamente nessa ordem) enfim, um tsunami de sensações e impressões com as quais nós todos temos que lidar fazendo uma cara boa ao mesmo tempo em que seguimos com nossas vidas, trabalhando, estudando, whatever... Pois bem, estava eu hoje, voltando pra casa, refletindo, esmagado pelo reconhecimento de toda a existência, quando um pensamento emergiu da minha mente borbulhante e angustiada.

Antes de começar a falar sobre esse pensamento, eu gostaria de convidar o leitor a lembrar-se se às vezes, aparentemente do nada, vem uma tristeza daquelas, que te atinge como um raio. Numa hora você acha que está perfeitamente bem, em outra, uma coisa que você percebe (com seus sentidos ou pensamentos) inofensiva de repente te leva a uma linha de raciocínio degradante, seguida da sensação de que você está descendo num carrinho de montanha russa rumo a uma realidade devastadora.

Quando eu estava no carrinho de montanha russa, já me cagando todo com o vento da morte ressecando meus olhos e congelando a minha cara, veio um pensamento inesperado para uma crise de drama iminente. Uma voz na minha cabeça disse: 

Olha, desculpa interromper essa descida alucinante que você está fazendo, mesmo que embora você tenha o perfeito controle sobre os seus pensamentos e ainda assim mostre certa relutância de sair dessa, mas vem cá. Aqui entre nós, por que mesmo que você está tão triste, hein? Quero dizer, tudo bem, vá lá que você tenha seus motivos e tal. Mas vamos ser objetivos aqui: onde você espera chegar assim?

Na minha perplexidade, eu não fui capaz de conceber uma resposta imediata, é claro. Mas pensando melhor sobre o assunto (e você já deve esperar que eu diga o que vem a seguir), a voz na minha cabeça tinha razão.

Naturalmente ser adulto, assim como todas outras fases da vida, proporciona certos conflitos com os quais a gente tende a se sentir incapaz de lidar. Por isso nossa espécie desenvolveu um superpoder para resolver um problema que nós inventamos para nós mesmos justamente quando começamos a pensar: o raciocínio. É simultaneamente genial e desesperador que isso seja tanto o problema quanto a solução, mas vamos lá. Raciocinar nos levou a desenvolver a linguagem entre nós e outros seres humanos. Então desde antes da fala, nossa espécie já tinha um jeitinho bem peculiar de se expressar e a comunicação só existe quando há um propósito na mensagem.

Então, primeiro: eu já sei que uma onda de tristeza vem da minha insatisfação com algumas coisas, da minha sensação de impotência diante de certos fatos ou circunstâncias que eu gostaria que fossem diferentes. Segundo: quando eu mergulho em um poço de tristeza, ou pelo menos começo a colocar os trajes de banho listrados em preto e branco à la Tim Burton, eu estou dando ao meu corpo a oportunidade de se expressar por mim, sem intervenção do meu raciocínio e uso consciente da linguagem. Isso porque certamente haverá uma resposta física à minha situação psicológica que é involuntária e típica desses momentos: ombros caídos, passos lentos, semblante abatido e um silêncio desesperado para ser ouvido (para que percebam que eu não estou falando). Isso tudo significa que nessa hora eu estou permitindo que meu corpo se comunique com os outros seres humanos e diga  a eles que eu não estou sendo capaz de lidar com as coisas que estão me afligindo.

Por que isso é ruim? Ora, "por que"! Isso me mostra frágil e dependente e, bem, na vida adulta, fragilidade e dependência não são necessariamente grandes qualidades, não é mesmo? O que a gente gosta é de ser capaz de ir lá e resolver nossas coisas sozinhos. De conseguir se virar emocionalmente pra que as outras pessoas, que também são bem frageizinhas, queiram ficar perto da gente porque pra elas, a gente é normal.

Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

É sério. Cala a boca.

A essa altura do texto eu não lembro exatamente porque eu estava começando a ficar triste, mas agora parece tudo muito bobo. É bom às vezes esmiuçar essas sensações negativas, sabe? Ir lá bem fundo e tentar descobrir realmente de onde elas vêm e brincar um pouquinho com elas na cabeça. Vale à pena sentar e chorar um pouquinho? Claro que vale. Deitar no chão no banheiro em posição fetal com chuveiro ligado ao som de músicas tristes, mandar textão pro melhor amigo (ou horas de áudio que ele vai odiar, mas vai ouvir, ainda que provavelmente enquanto passa um pano na casa ou procurando alguma coisa pra ver na Netflix), etc. Porém, antes de tomar *bebidas* drásticas, provocar um pouquinho o seu cérebro pode ser divertido e te tirar da bad rapidinho.