quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Aqui e agora: apenas um ponto de vista

There lies one insular entity in my soul,
 forcing me to break free from fetters to fetters.
 Tell me, Little One, am I a fool for still believing in utopia?

-Ichabod-*

*


Todas as tardes tem o mesmo cheiro. Eu só não fui capaz de perceber isso porque o meu cérebro estava ocupado demais tentando interpretar os sinais que os olhos enviavam para ele. Mas naquele momento letárgico entre estar dormindo e acordado, quando o peso do seu corpo se esvai completamente e você começa a atravessar aquela barreira mágica entre este mundo e o mundo dos sonhos, é possível embarcar numa viagem sensorial “às cegas”. 

É aí que as cores das coisas se tornam mais belas, sua pele fica sensível a ponto de ser finalmente capaz de sentir a temperatura real do ambiente, sua audição consegue determinar o espaço e até mesmo os irritantes gritos das crianças brincando nas ruas ficam, de alguma forma, harmônicos. Todo o resto, as estúpidas urgências que a responsabilidade exige, os angustiantes e inalcançáveis prazeres imediatos, as vertiginosas voltas do relógio que sempre te ultrapassam, enfim, toda aquela tsunami de expectativas maduras, some.

– “Em que mundo você prefere viver?” – citou o homem de cartola colorida que morava naquela casa feita de doces, onde acabei indo parar. – Ora – ele deu um tapa displicente no ar e contraiu os lábios, girando os olhos para cima com desdém –, que pergunta idiota! É óbvio que este aqui é muito melhor, meu querido! Você prefere este, mas está preso ao outro. Separados por coisas bobas como letrinhas nas palavras real e ideal.

– Você não passa de um vaidoso. Olha tudo o que aconteceu por sua causa! – berrou o peixe de jujuba no aquário de calda de framboesa. – Tudo o que existe aqui é você, até mesmo eu!

Hu-hum! – pigarreou o homem de cartola colorida. – O que ele quer dizer é que você não vai perceber a existência de nada, a não ser que seus sentidos mandem as coisas para que seu cérebro interprete. Você vê este peixe e automaticamente ele se torna simplesmente uma imagem aceitável para o seu cérebro.

– Querido, estamos falando de um peixe de jujuba num aquário de calda de framboesa – repliquei. – Como isso pode ser aceitável?

O homem de chapéu arregalou os olhos para mim, tomado por uma inesperada perplexidade. Em seguida enfiou as pontas dos dedos de luvas no aquário e, num movimento furtivo, comeu o peixe.

– Por isso que ele não era um peixe! Era uma bela e robusta jujuba.

– E eu nem gosto de framboesa – deixei escapar.

– Parece que você está finalmente reparando no óbvio. Porque o que há nesse aquário é leite.

– E isso nunca foi um aquário, para ser honesto – acrescentei, achando divertido. – Trata-se de um simples copo.

– A mensagem que eu enviei deve ter chegado à sua cabeça – sorriu-me o homem. – A percepção é convencional. As leituras de todos esses agrupamentos de átomos é exclusivamente sua. O fato de você ser um humano e perceber o mundo em três dimensões, com estas cores, cheiros, temperaturas, texturas e sabores não garante que ele seja assim, de fato. Tempo e espaço se retorcem acima e abaixo de nós e nós nem podemos dizer onde diabos é em cima e embaixo.

~.~

*Imagem e citação: Dopaprime

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Please don't go, I'll eat you whole




Primeira ilustração da minha série para as músicas de Alt-J, começando com Breezeblocks, do álbum An Awesome Wave.
A canção fala sobre relacionamentos abusivos, nos quais uma pessoa gosta tanto da outra que chega a machucar a ela e a si própria para mantê-la por perto. Quem viu o videoclipe da cantora Pink para "Please don't leave me" deve entender.
Minhas influências para essa ilustração foram alguns trabalhos de Andy Houghton, que eu amo, a própria letra de Breezeblocks e fotos de ataques de leões a herbívoros na África.

Deviations

Estou de volta também ao DeviantART (clica!), onde vocês podem ver a minha galeria maravilhosa hahahaha! #vemk


O retorno da garrafa jogada ao mar

Há um tempo eu havia deixado de escrever aqui. Eis a desculpa: fiquei sem tempo. Eis a verdade: havia perdido o interesse. Mas hoje me deu saudade de postar coisinhas, sabe? Eu tenho tido conversas maravilhosas com alguns amigos e os resultados dessas conversas são pensamentos maravilhosos, conclusões sobre o mundo realmente iluminadas, que vale a pena registrar e compartilhar. Não sou de postar meus textos no Facebook, apesar de o alcance ser claramente maior que o do Blogger, porque acho que aquela rede social, como chamam, não tem espaço para tudo. Sendo assim, volto ao Minhas Drogas com muitas ideias para textos que eu vou tentar postar o mais frequentemente possível. Meus textos são como uma carta que eu coloco numa garrafa e jogo ao mar, na esperança de que alguém encontre e que eles façam uma diferença positiva na vida dessas pessoas.