sábado, 2 de novembro de 2013

Atualizado: O Príncipe do Apocalipse

Recentemente adicionei os capítulos 5 e 6 do Príncipe do Apocalipse, que já estava devendo há um tempo. Sei que pouquíssima gente se interessa pela história, mas enquanto eu tiver pelo menos 1 leitor, estarei dando o melhor de mim nas minhas histórias.

Para ler essa história, clique no banner ao lado ou aqui mesmo!
Obs.: palavrões, violência, sexo e drogas [+18]


Mixtape: Dream Kiss

Mais umaaaa! Essa custou, mas saiu perfeitinha como eu queria. Demorei pra achar uma música que fechasse a sequência, então One Republic surgiu pra me salvar. Infelizmente Major Lazer ficou de fora, mas talvez entre na próxima. Curtam aí!



Indico para: correr, pedalar, malhar, começar o dia, fazer faxina ou lavar a louça kkkkkkk



 Tracklist:

1 - Joywave - Tongues (ft. Kopps) (RAC Mix)
2 - Young And Beautiful - Lana Del Rey (Kaskade Mix)
3 - Daughter - Youth (Alle Farben remix)
4 - Safe and Sound - Capital Cities (Party Ghost Remix)
5 - One Republic - Counting Stars (HLM Remix)


sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Conto: João Caminha




Um raio de sol pula da grande bola de fogo em que nasceu e, penetrando a atmosfera da Terra junto a vários outros, traz consigo uma onda de luz e calor que colide com o telhado de João. Quando o calor acumula-se o bastante, João aperta os olhos e levanta da cama com seu short de ursinho para abrir a janela.

Uma lufada de vento quase derruba o rapaz, que se apoia no parapeito e contempla a cidade diante de seus olhos. Gatos pulam de um telhado a outro, escorregando no lodo. Fios entre um poste e outro e varais abarrotados de lençóis e roupas íntimas compõem a gigantesca teia de aranha que une o lugar mais parecido com uma colcha de retalho que você já viu. Muito barulho sobe das ruas estreitas, assim como o calor e os aromas ricos em tempero e amaciante, e vão para cima entre os muros e as janelas, até se perderem no espaço.

João respira fundo e, inspirado pelo azul sobre sua cabeça, decide sair para dar uma volta. É seu primeiro ano naquela cidade e ele acredita que finalmente se encontrou. Diante do espelho, passa uma escovinha de plástico nos cabelos, alisa a barba e pinga o perfume de um vidrinho nas pontas dos dedos, que depois passa atrás das orelhas e nos pulsos. Aí ajusta o relógio no braço magro e cabeludo, ensaca a camisa de botão, estufa o peito e, quando o vemos, já está caminhando pela calçada.

As casas projetam uma sombra agradável sobre a rua inteira, que mesmo cheia de gente, ainda consegue ser fresca. Ele cumprimenta a vizinha da frente, que pergunta por seu gato pela milésima vez: “Cadê Xuxí?”. O bicho sumira havia mais de dois meses, mas ele não se incomodava nem um pouco em responder que achava que Sushi havia arrumado uma namorada. Ele não.

Namorada João não tinha mais, mas vivia se apaixonando. Eram paixões de quinze minutos, com todos os estágios: encantava-se por essas moças, projetava nelas seus ideais e imaginava futuros prósperos com casas, filhos, carros, cachorros e sexo todas as noites. Depois que as via partir, sentia seu coração despedaçando. Então remendava o que sobrava e, no dia seguinte, fazia tudo novamente. É claro que em nenhuma dessas ocasiões ele chegava sequer a falar com as donzelas em questão. Tudo era psicológico.

Era isso que sua mãe costumava dizer de suas dores de cabeça, febres e enjoos quando, na infância, tentava justificar sua relutância em ir pra escola. Lembra-se disso quando passa pela instituição onde agora trabalha como inspetor, mas está de folga. Esse novo emprego foi maravilhoso para João, pois lhe dera uma perspectiva dos alunos que o permitiu refletir sobre si mesmo. Fora do cerco medievalmente moralista dos professores e suas impenetráveis fortalezas (salas de aula), os mais jovens tinham assuntos e atitudes muito mais interessantes do que as matérias estudadas a força e os comportamentos impostos.

Mais adiante vê o Bar do Flamengo, onde aprendeu a beber sem vomitar e até mesmo a tragar os cigarros que fingia fumar só pela pose. Fizera amizade com um dos garçons e já tinha até uma conta. Olha para o lugarzinho com bons olhos. É como um refúgio na sexta-feira, quando chega do trabalho. A cerveja gelada desce por sua garganta como um milagre curando as chagas do mundo.

A independência lhe é de profundo agrado. Uma coisa recém-conquistada que lhe dá muito o que pensar durante o dia, garantindo-lhe um sono tranquilo à noite. João é livre como os passarinhos. Talvez até mais, por não precisar voar em formação V como as pessoas que via no trabalho, que vira passar por sua vida inteira.

Chegando à pracinha, faz questão de passar por um grupo de pombos que numa confusa revoada, deixam o lugar – inclusive cheio de bosta. “Qual é mesmo o coletivo de pássaro? Cardume? Não, isso é de abelha” João ri sozinho. Senta por ali sem escolher muito e observa uma joaninha – faz tempo que não via uma dessas – andando sem rumo numas folhas. Está mais acostumado a ver os soldadinhos, mas hoje não tem nenhum. Há uns garotos jogando futebol. Parece até que nesse país ninguém sabe jogar outra coisa, pensa.

Planeja ver um filme mais tarde e encontrar com uns amigos pra beber alguma coisa. Domingo vai ter praia e depois uma macarronada na casa de sua mãe, que já não vê há uns quinze dias.

Ele respira fundo pra absorver seja lá o que for que deixa aquelas plantas tão radiantes, e fecha os olhos. Ele se dá esse minuto de babaquice, até porque já passou pelo suficiente na vida pra aprender a ignorar a opinião alheia. Tudo que vê agora é o laranja atrás de suas pálpebras contra o sol. Aquilo é até bom. Começa a viajar dentro da própria cabeça.

- João? – Uma sombra cobre seu sol.

- Hã? – João tenta recuperar a visão fazendo uma careta. A silhueta de uma moça muito bonita, de cabelos compridos, óculos de sol pendurados no decote, uma chave de carro numa mão e um menininho loiro segurando a outra. – Sandra?

- Ah, é você mesmo! – Ela o abraça pelo pescoço, depois, num movimento ninja, agarra novamente a mão do menino como se segurasse um balão prestes a subir e sumir no céu. – Menino, quase não te reconheci com essa barba! Ta parecendo um remanescente de Woodstock!

João se ajeita no banco. – Oi, Sandra. Tudo bem?

- Tudo ótimo. Olha, esse aqui é o meu filho, Anderson. Deixa eu te apresentar o pai dele – ela joga uma mecha clareada pra trás da orelha e grita: “Mozão, vem aqui conhecer uma pessoa!”

Tem um monte de homens na direção que ela chamou, João nem quer ver qual é o que se chama Mozão.

- Ai, eu tenho tanta coisa pra te contar – ela vai logo se sentando. – Casei ano passado, foi uma festa tão linda! Eu até teria te mandado um convite, mas você sumiu! Depois que eu me formei em administração eu conheci esse cara lindo – sem ofensa, é claro que você não sente mais nada por mim, né? – daí a gente viajou pra Itália, isso na lua de mel, mas eu quis conhecer Paris, Londres, Lisboa, foi tudo de bom. Agora a gente ta morando a dez minutos da praia. Eu nem acredito, parece um sonho! Faz só um ano que a gente se viu, mas dá a impressão de que faz tanto tempo, né?

João repara que o sol se escondeu atrás de uma nuvem e que o céu está começando a ficar cinza.

Sandra parece deslocada naquela praça, pois ao contrário dela, o lugar é meio decrépito: rachaduras no chão, uns vira-latas aqui e ali, até bosta de pombo tem, quase formando um tapete sob seus pés. Mozão e o carrão que os trouxe estão diante da agência do banco e ele tem cara de gerente. Enfim...

- Mas me fala de você – Sandra insiste na conversa. – Como é que tá sua vida, o que você tem feito, tal...?

- Eu?

- Sim!

- Eu, nada.



Gilson França, 01 de Novembro de 2013


Imagem: Innsbruck by Pajunen