sábado, 4 de março de 2017

Seria um sonho se as pessoas vissem seus corpos como vêem as flores

Veias por toda parte?

Elegante!
~
Despigmentação na pele? Marcas de nascença?
Arrasa muito!
~
Cicatrizes? Marcas de arranhão?
Lindo!
~
Sardas? Verrugas? Marcas de espinhas?
Afe! Demais!
~
Curvas sinuosas?

Adorável!
~
Pequenina e magrinha?
Deslumbrante!
~
Falta alguma coisa?
Linda como sempre!
~
Sente-se a diferentona?
Você está fantástica!

Tradução livre deste post
Vamos nos amar como somos!

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

A Francesca (conto)




Apesar de cientistas afirmarem que a humanidade como nós a conhecemos hoje já caminha pela face da Terra há cerca de 50 mil anos, alguns indivíduos homo sapiens parecem fazer questão de refutar tal cálculo através de atitudes bastante peculiares, levando-nos a crer que só estamos aqui há apenas dois mil e poucos. Esse comportamento vai contra o que se espera de vinte e cinco vezes mais tempo de evolução e contra isso os cientistas não podem argumentar. No entanto, uma observação global revela algo bom para pessoas otimistas: Há evidências de que a humanidade teria evoluído em ritmos descompassados em diferentes partes do planeta. Há evidências também, de que os indivíduos mais evoluídos se concentram em determinado hemisfério do globo terrestre. Assim como há frequentes evidências de que “evolução” é equivocadamente interpretada como algo bom.

Façamos um paralelo entre dois lugares. De um lado, a França: país de pessoas sofisticadas, sempre lembrado por belezas como o Arco do Triunfo e a Torre Eiffel. Seus perfumes são tão sedutores quanto sua literatura e idioma. O clima favorece a boa moda e a soma de tudo isso atrai a atenção, o carisma e os turistas do mundo inteiro. Do outro, a Francesca, município às margens de uma pequena capital no Brasil, que de maneira muito obscura tem alguma participação francesa em sua breve história (50 anos), e que é uma paródia de mal gosto de uma cidade, tendo as mesmas características que a França, só que ao contrário.

Certa noite, na Francesca, um grupo de nativos que teve acesso a microfones e caixas de som estava reunido, celebrando com muito escândalo a existência de uma entidade mística que tinha dois mil e poucos anos. Seu nome era Mana, filho de Goh – O tal Goh tinha fama de existir antes mesmo do universo. Os motivos da celebração incluíam: 1 - o grupo concordava com a existência da entidade unanimemente, embora divergissem sobre o propósito dessa existência, pois ela era meramente psicológica, então estava passível de múltiplas interpretações; 2 - os membros do grupo se alegravam ao expressar verbal e fisicamente submissão a Mana em troca de um lote no suposto mundo supostamente habitado por ele e seu pai; 3 - o grupo duvidava que a Mana sozinho reconhecesse seu mérito como servos, então precisava que seus indivíduos competissem, mostrando uns aos outros que estavam cumprindo bem o seu papel. A celebração seguia freneticamente.

A duas quadras de distância, morava Joel, que não conseguia descobrir se estava frio ou quente porque a temperatura de seu corpo estava completamente instável, devido a uma febre pertinente. Joel não conseguia também repousar, como recomendaram seu médico e sua mãe, justamente por causa da celebração na vizinhança. Em sua agonia, o rapaz tentava acalmar-se imaginando em que momento da evolução seu cérebro havia ficado diferente dos fiéis fervorosos que aparentemente nunca tinham dor de cabeça ou de garganta. Sua própria mãe, Dona Neta, também acreditava em Mana, seu pai Goh e outros personagens de um épico da baixa literatura milenarmente mal interpretado. Mas ela fazia parte de um grupo mais antigo e silencioso, porém com uma história sombria e sangrenta que ficou no passado e deu lugar a ovelhas cansadas. 

Criado para temer a Goh e amar a Mana, assim como seus ancestrais por motivos mesquinhos, Joel imaginava ter um propósito para todo seu sofrimento. Os adoradores acreditavam que Mana passou por coisas horríveis até reconquistar o lugar de onde foi posto pra fora após o conflito entre Goh e dois elfos rebeldes, dando início a uma guerra que de tão incoerente, passou a ser amplamente aceita. “Vamos balançar a cabeça e dizer que entendemos, porque nossas dúvidas são tão óbvias que pareceremos idiotas perguntando.”, diziam a si mesmas as pessoas que ouviam ou liam a história. Joel estava passando por coisas terríveis (ou pelo menos assim elas eram em sua cabecinha), mas aguentava firme e forte esperando a boa vontade de Goh reconhecer seu sofrimento e fazer algo a respeito para compensá-lo. Enquanto isso, ele nutria sonhos de um dia ir embora da Francesca e ser feliz ao lado de um homem que amaria por muitos anos.

sábado, 21 de janeiro de 2017

Faith


Nunca pensei. A vida hoje parece tão diferente. É como se toda a mudança que eu sempre quis tivesse chegado de uma vez e agora eu não soubesse o que fazer com ela. O passado me parece fragmentos de um filme mal produzido e mal roteirizado que só podia contar com um protagonista cheio de paixão. Era ele e não a história o tempo inteiro. É realmente difícil de acreditar que tudo aquilo aconteceu: que eu estive em todos aqueles lugares, que todas aquelas pessoas eram de carne e osso ao invés de pontos piscando atrás das minhas pálpebras. Depois das feridas fechadas e do novo perfume desse cenário familiar, parece que tudo não passou de um delírio que eu tive à porta de casa e que eu nunca cheguei a sair de verdade. Há ainda a sensação de que eu estou traindo aquele eu ao encontrar tanta indiferença diante dos "fatos". Um pouco de culpa por estar feliz, por estar bem melhor assim, Mas isso que é paz. É assim que eu me reencontro com um "eu" de uma época ainda mais distante. É assim que fazemos as pazes.
Lírio dos vales, 16 de março de 2014 



Lírio dos vales foi escrito por mim há três anos. Pelo que me consta, época em que eu larguei a faculdade de Letras na UFPB para viver outras coisas. Curtir mais a minha casa e minha família, especialmente. O que me chama atenção nesse texto é o fato de, naquele momento, eu estar tão satisfeito com a minha decisão, tão seguro, que uma sensação implacável de paz se abateu sobre mim, varrendo os receios para longe ao simplificar tanto o passado que as lembranças ficam num limbo entre memória e devaneio.

Poucas vezes na vida eu me senti tão satisfeito com uma decisão. Aquela busca por satisfação comigo mesmo, que levaria à satisfação com a minha vida, estava apenas começando. A autocompaixão é uma coisa muito dura de se conquistar. Eu exigia muito de mim mesmo; minha própria professora da quarta série já me falou isso! Essa exigência foi muito mais severa na adolescência, levando a minha autoestima pelo ralo. Uma adolescência problemática assim só poderia me tornar num jovem adulto problemático, instável emocionalmente, carente, dependente, insatisfeito consigo, como muitas pessoas que eu conheço nessa idade hoje são.

Mas eu sempre tive fé que um dia eu iria entender algo que estava na minha cara o tempo todo, mas ao mesmo tempo algo tão importante que de duas, uma: Ou minha vida iria se desgraçar de uma vez e eu entraria em um colapso irreversível, ou eu conciliaria todos os meus pensamentos numa corrente fluida e coerente. 

Largar a universidade em 2014, terminar o relacionamento abusivo que vivi em 2015 e enfrentar uma área fora da minha zona de conforto no trabalho em 2016 foram coisas que me mostram que eu realmente tirei alguma coisa de tudo que eu vivi, de todas as coisas que deram errado.

Vez por outra eu estou enfrentando um probleminha que me entristece bastante, isso porque eu, como o resto da Geração Y, sou muito ansioso. Mas aí o que me resta é tentar controlar os impulsos (coisa em que eu estou me saindo muito bem) e ficar de olho em alguns sinais que a vida vai mostrando, que dizem coisas como "não faz isso", "experimenta tal atitude" ou "é por aí mesmo, ta dando certo".

Mesmo que eu faça um draminha, eu acho que estou conseguindo conduzir essa nave da melhor maneira possível e estou bem feliz com tudo isso. Ainda mais agora que escrevi esse texto. :)

P.S.: A flor ilustrando esse texto não é um Lírio dos vales. O motivo da escolha é que o título da fotografia é Faith.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Cada sarda sua - Tradução de 'Every other freckle', de Alt-J

Dê o play aqui

Oooaaahhhh
Eu quero partilhar da sua boca cheia
Quero saber de todas as coisas que os seus pulmões sabem tão bem
Eu quero me aninhar em você um gato se aninha num pufe
Virar você do avesso e te lamber como uma tampa de iogurte

Oh, ooh - Ei!

Você é o primeiro e último da sua espécie (me puxe como se eu fosse um animal num buraco!)
Eu quero ser cada alavanca que você puxa
E todos os banhos que te banham
Quero tatear você como um gato tateia meu casaco de lã
Ser seu Pequeno Polegar
E desfrutar de coisas pequeninas e belas

Ei!
Oh, ooh
Devore-me
Ooohhh

Lou, Lou, que cantem as meninas do cover
Ei!

Du, du du du, du du du duuuuu
Du du du,  du du du,  du du du du, du duuuuu
Du du du,  du du du,  du du du du du,  du du du du duuuu

Todas as mãos aplaudem
Você aplaudirá
Deixe-me ser o papel de parede que reveste o seu quarto!
Eu quero ser cada botão que você aperta
E todos os banhos que te envolvem
É, eu vou rolar em você
Como um gato num pátio de serragem - Ooohhh
Eu vou te beijar
Como o sol que te bronzeia

Ei!
Oh, ooh - Ei!
Devore-me
Oh, ooh - Ei!
Devore-me
Se você acha mesmo que consegue me digerir - Ei-ei!

Eu quero cada sarda sua
Eu quero cada sarda sua, sarda


Videoclipes
Versão Boy: https://www.youtube.com/watch?v=axTSc3e6wu8
Versão Girl: https://www.youtube.com/watch?v=-mhgfXgwdls

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Boa tarde. Desculpa interromper a sua viagem, mas eu gostaria de deixar com você um pouco da palavra do seu cérebro


Muito bem. O ano de 2017 chegou e com ele muitas promessas, expectativas, frustrações, (necessariamente nessa ordem) enfim, um tsunami de sensações e impressões com as quais nós todos temos que lidar fazendo uma cara boa ao mesmo tempo em que seguimos com nossas vidas, trabalhando, estudando, whatever... Pois bem, estava eu hoje, voltando pra casa, refletindo, esmagado pelo reconhecimento de toda a existência, quando um pensamento emergiu da minha mente borbulhante e angustiada.

Antes de começar a falar sobre esse pensamento, eu gostaria de convidar o leitor a lembrar-se se às vezes, aparentemente do nada, vem uma tristeza daquelas, que te atinge como um raio. Numa hora você acha que está perfeitamente bem, em outra, uma coisa que você percebe (com seus sentidos ou pensamentos) inofensiva de repente te leva a uma linha de raciocínio degradante, seguida da sensação de que você está descendo num carrinho de montanha russa rumo a uma realidade devastadora.

Quando eu estava no carrinho de montanha russa, já me cagando todo com o vento da morte ressecando meus olhos e congelando a minha cara, veio um pensamento inesperado para uma crise de drama iminente. Uma voz na minha cabeça disse: 

Olha, desculpa interromper essa descida alucinante que você está fazendo, mesmo que embora você tenha o perfeito controle sobre os seus pensamentos e ainda assim mostre certa relutância de sair dessa, mas vem cá. Aqui entre nós, por que mesmo que você está tão triste, hein? Quero dizer, tudo bem, vá lá que você tenha seus motivos e tal. Mas vamos ser objetivos aqui: onde você espera chegar assim?

Na minha perplexidade, eu não fui capaz de conceber uma resposta imediata, é claro. Mas pensando melhor sobre o assunto (e você já deve esperar que eu diga o que vem a seguir), a voz na minha cabeça tinha razão.

Naturalmente ser adulto, assim como todas outras fases da vida, proporciona certos conflitos com os quais a gente tende a se sentir incapaz de lidar. Por isso nossa espécie desenvolveu um superpoder para resolver um problema que nós inventamos para nós mesmos justamente quando começamos a pensar: o raciocínio. É simultaneamente genial e desesperador que isso seja tanto o problema quanto a solução, mas vamos lá. Raciocinar nos levou a desenvolver a linguagem entre nós e outros seres humanos. Então desde antes da fala, nossa espécie já tinha um jeitinho bem peculiar de se expressar e a comunicação só existe quando há um propósito na mensagem.

Então, primeiro: eu já sei que uma onda de tristeza vem da minha insatisfação com algumas coisas, da minha sensação de impotência diante de certos fatos ou circunstâncias que eu gostaria que fossem diferentes. Segundo: quando eu mergulho em um poço de tristeza, ou pelo menos começo a colocar os trajes de banho listrados em preto e branco à la Tim Burton, eu estou dando ao meu corpo a oportunidade de se expressar por mim, sem intervenção do meu raciocínio e uso consciente da linguagem. Isso porque certamente haverá uma resposta física à minha situação psicológica que é involuntária e típica desses momentos: ombros caídos, passos lentos, semblante abatido e um silêncio desesperado para ser ouvido (para que percebam que eu não estou falando). Isso tudo significa que nessa hora eu estou permitindo que meu corpo se comunique com os outros seres humanos e diga  a eles que eu não estou sendo capaz de lidar com as coisas que estão me afligindo.

Por que isso é ruim? Ora, "por que"! Isso me mostra frágil e dependente e, bem, na vida adulta, fragilidade e dependência não são necessariamente grandes qualidades, não é mesmo? O que a gente gosta é de ser capaz de ir lá e resolver nossas coisas sozinhos. De conseguir se virar emocionalmente pra que as outras pessoas, que também são bem frageizinhas, queiram ficar perto da gente porque pra elas, a gente é normal.

Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

É sério. Cala a boca.

A essa altura do texto eu não lembro exatamente porque eu estava começando a ficar triste, mas agora parece tudo muito bobo. É bom às vezes esmiuçar essas sensações negativas, sabe? Ir lá bem fundo e tentar descobrir realmente de onde elas vêm e brincar um pouquinho com elas na cabeça. Vale à pena sentar e chorar um pouquinho? Claro que vale. Deitar no chão no banheiro em posição fetal com chuveiro ligado ao som de músicas tristes, mandar textão pro melhor amigo (ou horas de áudio que ele vai odiar, mas vai ouvir, ainda que provavelmente enquanto passa um pano na casa ou procurando alguma coisa pra ver na Netflix), etc. Porém, antes de tomar *bebidas* drásticas, provocar um pouquinho o seu cérebro pode ser divertido e te tirar da bad rapidinho.

domingo, 3 de abril de 2016

25 verdades sobre mim

Quem disse que quem se define se limita? Já vi alguns vídeos de vloggers com listas de "fatos" sobre eles, mas nunca tinha pensado em fazer uma dessas sobre mim até hoje. O legal dessa lista nem é mostrar para as pessoas mais informações do que elas precisam sobre você, mas o exercício de honestidade consigo mesmo que isso proporciona. Eu tentei ser o mais sincero possível e não me orgulho de tudo o que está aí. Recomendo muito a experiência!


1. Não gosto de gatos nem nada que a internet produz sobre eles.
2. Canto e até danço na rua de vez em quando.
3. Não tenho paciência com gente mal resolvida.
4. Não gosto de gente que PROMOVE(!!!1!) suas ideologias.
5. Não gosto de gente preguiçosa.
6. Não gosto de falsos-descontentes.
7. Me sento de pernas cruzadas de vez em quando.
8. Gosto de promover o afeto e ver todo mundo se abraçando.
9. Gosto de ficar sozinho e aproveitar minha própria companhia, independente do meu estado emocional.
10. Não consigo conversar com muita gente ao mesmo tempo.
11. Não sei cozinhar (quase) nada.
12. Sou manhoso quando fico doente.
13. Gosto de olhar para as coisas até achar que elas são estranhas.
14. Acabo procrastinando e faço maravilhas sob pressão.
15. Às vezes eu não entendo nada que as pessoas falam.
16. Eu preciso me sentir estimulado pelas pessoas ao meu redor.
17. Eu me afasto das pessoas que não me fazem sentir bem, independente do que já tenhamos vivido.
18. Não consigo rir com filmes de comédia nem me assustar com terror, mas os dramas acabam comigo por mais bestas que sejam.
19. Eu me atraio por pessoas que não acho bonitas.
20. Não gosto (mais) de comer besteira.
21. Acho o sotaque nordestino fascinante e forço o meu.
22. Detesto o lugar chamado zona de conforto.
23. Amo ir contra a maré se eu acreditar que isso vai ter um bom resultado.
24. Detesto hype.
25. Detesto gente que reproduz discurso e não tem um pingo de autenticidade.
Faltou um monte de coisas, claro. Meditei sobre essa lista e acabei me conhecendo melhor após lê-la em outro momento. Eu aposto que daqui a alguns anos ela vai estar bem diferente, mas isso não invalida a maravilha dessa brincadeira.

12 perguntas alternativas para fazer a qualquer pessoa

Cansado das mesmas perguntas quando estou conhecendo alguém, eu resolvi bolar um questionário diferente para desenvolver a minha impressão das pessoas. Vou aproveitar e perguntar também a quem eu já conheço.

1 - se você fosse outra pessoa, como você se apresentaria a si mesmo?
2 - que homem negro você acha atraente?
3 - que frase você gosta de ouvir as pessoas falando?
4 - com que animal você acha que teria uma boa conversa?
5 - que plano você abandonou para fazer algo completamente diferente?
6 - o que você faz quando não consegue dormir?
7 - qual dos seus sentidos você acha mais importante?
8 - qual é o lugar onde você se sente mais a vontade?
9 - que parte do seu corpo você mais acaricia?
10 - em que filme você se sente  a maior parte do tempo?
11 - qual você acha que será seu último pensamento?
12 - se você pudesse comprar uma única coisa a vida inteira, o que seria?

Eu quero dizer, perguntas sobre idade, profissão, estudos e signo não me deixam tão interessado em alguém. Não me dizem nada sobre a individualidade das pessoas. Já me decepcionei com a personalidade de pessoas que amam pizza e gostam das mesmas músicas que eu. Opiniões políticas? ZzZzZzZz... Causas que apoia? ZzZzZZzZzZz... Preciso sair da mesmice.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Aqui e agora: apenas um ponto de vista

There lies one insular entity in my soul,
 forcing me to break free from fetters to fetters.
 Tell me, Little One, am I a fool for still believing in utopia?

-Ichabod-*

*


Todas as tardes tem o mesmo cheiro. Eu só não fui capaz de perceber isso porque o meu cérebro estava ocupado demais tentando interpretar os sinais que os olhos enviavam para ele. Mas naquele momento letárgico entre estar dormindo e acordado, quando o peso do seu corpo se esvai completamente e você começa a atravessar aquela barreira mágica entre este mundo e o mundo dos sonhos, é possível embarcar numa viagem sensorial “às cegas”. 

É aí que as cores das coisas se tornam mais belas, sua pele fica sensível a ponto de ser finalmente capaz de sentir a temperatura real do ambiente, sua audição consegue determinar o espaço e até mesmo os irritantes gritos das crianças brincando nas ruas ficam, de alguma forma, harmônicos. Todo o resto, as estúpidas urgências que a responsabilidade exige, os angustiantes e inalcançáveis prazeres imediatos, as vertiginosas voltas do relógio que sempre te ultrapassam, enfim, toda aquela tsunami de expectativas maduras, some.

– “Em que mundo você prefere viver?” – citou o homem de cartola colorida que morava naquela casa feita de doces, onde acabei indo parar. – Ora – ele deu um tapa displicente no ar e contraiu os lábios, girando os olhos para cima com desdém –, que pergunta idiota! É óbvio que este aqui é muito melhor, meu querido! Você prefere este, mas está preso ao outro. Separados por coisas bobas como letrinhas nas palavras real e ideal.

– Você não passa de um vaidoso. Olha tudo o que aconteceu por sua causa! – berrou o peixe de jujuba no aquário de calda de framboesa. – Tudo o que existe aqui é você, até mesmo eu!

Hu-hum! – pigarreou o homem de cartola colorida. – O que ele quer dizer é que você não vai perceber a existência de nada, a não ser que seus sentidos mandem as coisas para que seu cérebro interprete. Você vê este peixe e automaticamente ele se torna simplesmente uma imagem aceitável para o seu cérebro.

– Querido, estamos falando de um peixe de jujuba num aquário de calda de framboesa – repliquei. – Como isso pode ser aceitável?

O homem de chapéu arregalou os olhos para mim, tomado por uma inesperada perplexidade. Em seguida enfiou as pontas dos dedos de luvas no aquário e, num movimento furtivo, comeu o peixe.

– Por isso que ele não era um peixe! Era uma bela e robusta jujuba.

– E eu nem gosto de framboesa – deixei escapar.

– Parece que você está finalmente reparando no óbvio. Porque o que há nesse aquário é leite.

– E isso nunca foi um aquário, para ser honesto – acrescentei, achando divertido. – Trata-se de um simples copo.

– A mensagem que eu enviei deve ter chegado à sua cabeça – sorriu-me o homem. – A percepção é convencional. As leituras de todos esses agrupamentos de átomos é exclusivamente sua. O fato de você ser um humano e perceber o mundo em três dimensões, com estas cores, cheiros, temperaturas, texturas e sabores não garante que ele seja assim, de fato. Tempo e espaço se retorcem acima e abaixo de nós e nós nem podemos dizer onde diabos é em cima e embaixo.

~.~

*Imagem e citação: Dopaprime

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Please don't go, I'll eat you whole




Primeira ilustração da minha série para as músicas de Alt-J, começando com Breezeblocks, do álbum An Awesome Wave.
A canção fala sobre relacionamentos abusivos, nos quais uma pessoa gosta tanto da outra que chega a machucar a ela e a si própria para mantê-la por perto. Quem viu o videoclipe da cantora Pink para "Please don't leave me" deve entender.
Minhas influências para essa ilustração foram alguns trabalhos de Andy Houghton, que eu amo, a própria letra de Breezeblocks e fotos de ataques de leões a herbívoros na África.

Deviations

Estou de volta também ao DeviantART (clica!), onde vocês podem ver a minha galeria maravilhosa hahahaha! #vemk